Tuesday 17 March 2015

Direitos Trabalhistas

Embora generalizações não sejam eficientes, algumas permitem pensar sobre recorrências no incerto, e às vezes incompreensível, presente. Uma delas diz que em todas as crises econômicas recentes, como remédio amargo e necessário, é receitada uma mudança nos parâmetros de direitos trabalhistas. 

Além de recorrente, o corte ou mudança da CLT, assim como a reforma tributária, é sempre apontado como necessário para a retomada da competitividade ou do crescimento econômico. E que, mais à frente, após a subida da íngreme ladeira do ajuste, significaria um alívio para o sacrifício executado.

Em geral, não há consensos claros sobre o que seria alterado e sobre a efetividade de medidas que mudam a relação entre empregados, patrões e governo. Mesmo o setor empresarial diverge sobre quais regras suprimir.

Um dado apontado por alguns economistas ao longo dos nossos últimos anos de bonança foi o aparentemente contraditório aumento da busca de seguro-desemprego e abono salarial, apesar do aumento do número de pessoas ocupadas.

Mais recentemente, parte da diminuição na taxa de desemprego foi creditada à saída de pessoas do mercado de trabalho. Isto porque mede-se o desemprego a partir do número de pessoas sem emprego que estão procurando por ocupação. 

Desta forma, quem opta voluntariamente por sair do mercado de trabalho não é contabilizado como desempregado. Ou seja, desemprego voluntário não aumenta a taxa de desemprego de economia, mas diminui o contingente da força de trabalho.

A saída voluntária do mercado não costuma ser benquista por quem estuda a economia. Ainda que a motivação seja o aperfeiçoamento profissional e o indivíduo retorne mais tarde mais produtivo, por algum tempo, a massa de salários e impostos derivados da atividade formal cai.

Hoje a medida de crescimento econômico usada, o PIB, capta mal ou não capta certos tipos de ocupações que não envolvem interação com o mercado de trabalho - formal ou não. Por exemplo, o dia a dia da dona de casa em seus afazeres domésticos não é contabilizado. 

Da mesma forma, um estudante ao parar de trabalhar para se aperfeiçoar não contribui diretamente para apuração dos valores do crescimento do que é produzido em um país. Muito embora, ressalte-se que, ao retornar, aquele camarada terá uma qualificação maior, que aumenta sua produtividade, crescendo, assim, sua contribuição à produção total do País.

Ao sair do mercado formal, em geral, é facultado ao trabalhador receber auxílio-desemprego durante um período. Ao mesmo tempo, ele ajuda a diminuir a massa de salários pagos na economia, o volume de riqueza que é produzido e aumenta a despesa do Governo com o pagamento de benefícios.

A queda do desemprego recente não tem a ver apenas com a saída de trabalhadores do mercado, no entanto. É visível que o aquecimento econômico dos últimos anos também redundou numa menor informalidade do emprego - que é tendência desde os anos 90. Dessa forma, mais pessoas passam a ter acesso a benefícios da CLT e mais indivíduos passaram a contribuir para a manutenção da rede de proteção do trabalhador, aumentando o número de contribuições.

A questão mais clara é que, embora o número de pessoas empregadas tenha crescido, houve expressiva alta do número de pedidos de seguro-desemprego. E, embora faça sentido, à medida que a taxa de pessoas desocupadas caiu e foi-se chegando a algo mais próximo do pleno emprego, era esperado que diminuísse o volume de recursos saindo do Tesouro para pagamento desses benefícios, considerando a dinâmica própria do sistema. Isto não aconteceu.

Entre parte dos economistas criou-se um consenso de que há grande volatilidade no mercado de trabalho, sobretudo nos setores em que aumentou o número de postos - notadamente de perfil salarial mais baixo e de mão de obra menos qualificada. Trabalhadores com mais poder de barganha por salários e que têm à disposição maior oferta de vagas mudam mais de emprego.

Por isso, tem-se entendido ser necessário, para ajudar a diminuição do ritmo de crescimento do endividamento do Tesouro, bem como para a redução das pressões salariais sobre a inflação, um freio à extrema mobilidade de trabalhadores entre ocupações. 

Veja-se também que o setor de menor renda tem apresentado crescimentos em seus ganhos acima das médias dos de maiores salários, forçando uma distribuição de renda via mercado de trabalho.

Para diminuir a mobilidade entre empregos nas camadas de mais baixa renda, o Governo apresentou projeto que ampliava o tempo necessário de contribuição para a retirada de benefícios trabalhistas. A ideia é criar um incentivo à permanência mais longa em cada vaga e diminuir a volatilidade da mão de obra, diminuindo as transferências de renda via Tesouro para os benefícios e as pressões no nível de salários.

É importante deixar claro que a teoria econômica dita clássica analisa o mercado de trabalho em um embate entre a oferta e a demanda por ocupações em determinado ponto do nível de salários. 

À medida em que sobe o nível dos vencimentos, se os empresários têm menos opção de repasse dos aumentos, se não conseguem transformá-lo em preços mais elevados, a tendência é que contratem menos. Dessa forma, o salário é a variável de ajuste entre demanda e oferta de mão de obra. Por isso, a maior mobilidade de trabalhadores é desejável, pois permite o equilíbrio eficiente no mercado.

Este modelo tem, obviamente, alguns fundamentos importantes. O primeiro: trabalhadores não recebem seguro desemprego ou outras rendas que o salário, o que faz com que este seja a variável de ajuste. 

Segundo, e fundamental em toda a teoria clássica, que salários sejam perfeitamente flexíveis, ou seja, que diminuam ou aumentem, mudando a oferta e demanda por trabalho. 

Terceiro e também importante, que a natureza do trabalho seja indistinta - tanto faz ser garçom ou sapateiro - ou que a capacidade de trabalhadores desempenharem diferentes ocupações seja total - o pedreiro hoje vira cozinheiro amanhã pela simples necessidade.

No mundo real, no entanto, há legislação que mantém algum tipo de rede de segurança para o desemprego e/ou que impede que salários sejam rebaixados. Esta, pela teoria, atrapalha o ajuste perfeito da oferta e demanda de trabalho causando desequilíbrio - que pode se traduzir em inflação ou desemprego. 

Há também alguma diferenciação entre as vagas ofertadas, mesmo em empregos de baixa qualificação. 

Há, ainda, no modelo, a suposição de que mudanças no nível dos salários são imediatamente percebidas por trabalhadores, que respondem entrando ou saindo do mercado. Obviamente, existe aqui a inobservância de uma cultura a respeito do valor do trabalho e também das condições econômicas que cercam o mercado. É uma enorme simplificação portanto. 

Em crises, quando sobe o desemprego, diminuições do nível de salário dificilmente provocam a debandada dos trabalhadores de seus postos, como predestina o mecanismo de ajuste do modelo.

A incapacidade de reduzir salários, no entanto, pode se tornar um impulso a preços de bens e serviços produzidos - e aqui as empresas repassariam os aumentos de salário ao valor daquilo que produzem, mantendo os níveis da oferta de vagas - ou pode ser uma ferramenta para a diminuição da demanda por mão de obra, ainda que os salários mantenham elevada a oferta, o que gera desemprego. 

Há contradições e simplificações nesta explicação sobre a dinâmica econômica e sobre o mercado para oferta e demanda de trabalho. Há empresas que são menos intensivas em mão de obra, logo a variável salário é menos importante na oferta de vagas ou na composição de preços. 

O curioso é que a matriz do ajuste econômico em curso é a teoria majoritária econômica que é de raiz neoclássica. Então, é entendido o viés pró-equilíbrio autônomo pela correção do sistema de preços - no caso, com a mudança do benefício trabalhista. Porém, ele é também contraditório, pois seu objetivo principal embora totalmente inserido na ortodoxia - o aperto recessivo de contas - tem como um dos propósitos limitar a mobilidade no mercado de trabalho, que pelo modelo clássico, para que o mercado seja eficiente, precisa ser máxima.

Entre a realidade e o modelo vai grande distância. O que está determinando qual medida usar é a necessidade do equilibrar as contas. E por isso, a mobilidade do mercado, para azar do modelo e dos trabalhadores, precisará ser contida. 

Wednesday 11 March 2015

Legalistas

O Governo Federal tentou e conseguiu uma conciliação a respeito do valor de correção da tabela do IR. Em linhas gerais, essa mudança significa compensar a perda inflacionária dos valores que correspondem aos limites das faixas que dividem contribuintes entre quem paga mais ou menos imposto. Ou seja, é simplesmente fazer com que os valores que dizem quem paga quanto de imposto subam um pouco de forma a considerar que reais na última revisão da tabela valem menos hoje. Já sabia-se que haveria ranger de dentes e birra. 
Semana passada, por ocasião da apresentação de parte do pacote de ajuste fiscal por tantos clamado, o senador Renan Calheiros devolveu a medida provisória que continha parte do arrocho por considerar que aquele conjunto de ações não poderia ser contemplado via medida provisória.
Questão de forma ou de adequação ao rito vigente, fato é, que dois senadores do PSDB, Serra e Aécio, foram à tribuna congratular Renan Calheiros pelo pito. Os jornalões noticiaram que Renan devolveu o texto ao Governo porque ele seria um dos denunciados no tufão da Lava Jato pelo procurador Rodrigo Janot. De fato, Renan e o presidente da câmara Eduardo Cunha foram denunciados.
Se cumpriu-se o rito normal e característico ao devolver a papelada, os dois senadores pelo PSDB passaram recibo de ultra legalistas que congratulam quem defende o próprio mandato com o interesse público do saneamento das contas.
Nenhum dos dois senadores têm qualquer sugestão para o ajuste fiscal pretendido e tão cobrado - embora fosse uma das pedras fundamentais da campanha do PSDB à presidência no ano passado e o conselheiro econômico do candidato Aécio Neves, Armínio Fraga, seu mais ardoroso defensor.
Nesta semana, a nova discussão reuniu a proposta aparentemente flexibilizada do Governo Federal de um ajuste na tabela do IR com faixas diferenciadas de acordo com a renda. De modo simples, quem ganha menos teria um reajuste maior - de 6,5% - e quem ganha mais, um menor de 4,5%. Com isso, o andar de baixo dos eleitores contribuiria menos com o esforço fiscal e o andar de cima com um pouco mais.
Isto porque ao reajustar mais intensamente a tabela para os que ganham menos, o sarrafo das alíquotas do IR fica um pouco mais alto, ou seja, permite a quem é mais pobre manter um pouco mais da renda que possui, pagando menos imposto. Para os mais afortunados pela meritocracia o sarrafo sobe menos, o que faria com que mais pagassem imposto.
Aécio, crítico do ajuste em curso - embora não no que Armínio propunha ano passado - informava que não aceitaria a correção da tabela em duas partes. Dessa forma, o único ajuste seria o de 6,5% para todos, que faria com que a arrecadação do Governo Federal caísse mais e se penalizassem igualmente andar de baixo e de cima.
Vale dizer que, anteriormente, a presidente fora Dilma foi contra o reajuste total da tabela pela alíquota de 6,5% - ela preferia o de 4,5% de modo a capturar mais impostos. O motivo é que, com o ajuste fiscal em curso, deverá haver uma queda real na renda esperada com a tributação. Em tempos de aperto de contas, parece o pior caminho. E é.
Felizmente, a proposta de escalonamento - duas correções diferentes tendo em vista a renda - foi publicada via medida provisória. 
Do episódio, no entanto, depreendem-se duas lições. Uma: opor é mais importante que propor. Duas: estelionato eleitoral não é só para quem ganha a eleição. 

Tuesday 10 March 2015

Inflação e Selic - 101

O noticiário tem reverberado as previsões do mercado financeiro a respeito do comportamento de juros e inflação mais à frente. As notícias parecem nada alvissareiras. O difícil é compreender de onde vêm e o que significam.

Em primeiro, de onde vêm as previsões do mercado? Em geral, de pessoas que lidam com o mercado financeiro cotidianamente - agentes que por exemplo estudam o comportamento da economia, bancos, grupos de investimento, empresários, gestores. 

Dois, por que o futuro não parece animador? A principal razão é que, nas consultas às pessoas que lidam diretamente com o mercado, o sentimento é o de que os que têm recursos sobrando cobrarão maiores retornos para emprestar dinheiro aos que não têm. E isso tem sido demonstrado nas previsões de juros futuros. Há ainda o aumento continuado das previsões da inflação deste ano por estes agentes.

O que as taxas de juro futuro têm a ver com inflação?

Há duas respostas, uma óbvia: os agentes que emprestam dinheiro querem retornos acima da inflação esperada. Isto faz com que com o aumento dos preços sobem os retornos esperados, logo os juros. E há outra não óbvia: o aumento dos juros tem poder sobre a inflação.

Como isto funciona?

O Banco Central é quem tem capacidade de emitir moeda no Brasil e controlar o seu emprego na medida em que controla a principal taxa de empréstimos no País, a que regula parte do financiamento público. E, avaliando os retornos cobrados pelos agentes do dinheiro emprestado, estipula nova taxa. Isto funciona através de um mecanismo simples porém sofisticado.

Governos precisam de recursos para suas despesas. Parte deles vêm dos impostos pagos. Outra parte pode ser obtida junto aos agentes privados que têm dinheiro disponível. Quando precisa se capitalizar, o Tesouro emite títulos que são comprados por agentes econômicos variados - fundos de pensão como a PREVI, bancos comerciais, empresas. Como prêmio pela compra, fixa-se uma taxa que valoriza o dinheiro pago e que compensará o emprestador, quando for feito o desconto do título, após o período estipulado de capitalização. Ou seja, ao comprar um título, o vendedor se compromete com uma rentabilidade futura do dinheiro empregado na compra .

Há vários tipos de títulos, alguns são remunerados pela taxa SELIC. Mas essa indiretamente ou diretamente influencia todas as outras.

As mudanças de remuneração na SELIC, o aumento ou queda da taxa de juros, acontecem toda vez que o Banco Central considera que o valor pago não é adequado aos objetivos que têm quando negocia os títulos.

Estes propósitos variam. Se o Bacen crê que a inflação está acima do ponto que deveria, de acordo com as metas que estabelece para economia e com as observações que faz, normalmente, ele anuncia um aumento da SELIC. Este aumento tem por objetivo diminuir o volume de dinheiro disponível no mercado, enfraquecendo a inflação. Funciona de maneira simples. 

Ao aumentar os juros, os prêmios dos títulos oferecidos pelo Tesouro para financiamento do Governo se tornam mais rentáveis. Assim, haverá mais investidores que consideram uma boa opção a compra de títulos e haverá um incentivo maior a troca de moeda na mão do público - dos agentes - por estes títulos. 

Na prática, haverá também menor quantidade de moeda na economia como um todo. Haverá menos valores para investimentos - por exemplo abrir um negócio - para o consumo - o dinheiro vira título e só retorna ao agente após o período de capitalização - e também para empréstimos. Desta forma, o aumento da Selic enxuga a quantidade de dinheiro disponível na economia, desaquecendo a atividade. O efeito esperado é a diminuição da inflação - menos gente consumindo, menores investimentos, logo, menor pressão da demanda por bens e serviços o que, dada a mesma oferta, permite a desaceleração dos preços. 

Ao mesmo tempo, porém, os aumentos da taxa SELIC implicam em maior endividamento - ou compromissamento - do Tesouro com os agentes que trocaram seu dinheiro por títulos. Eles deverão receber maiores retornos pelo empréstimo nos juros fixados. 

Isto depende também dos tempos de retorno dos títulos. Os de prazo mais curto - que são em grande parte o perfil da dívida pública nacional - têm impacto mais profundo das contas, pois toda vez que a SELIC é reajustada parte substancial deles é trocada por títulos mais novos e mais caros, o que aumenta o endividamento de curto prazo do Tesouro.

Efeitos da SELIC:

Se a SELIC é reduzida, o contrário acontece. Os agentes têm incentivos menores a reterem títulos e tendem a procurar outras atividades mais rentáveis para serem empreendidas com os recursos que têm disponíveis. 

Dessa forma, ao contrário do que se parece sugerir, endividamento não causa inflação. Há uma conjunção específica de fatores que levam ao aumento ou diminuição da inflação. Para que aconteça uma aceleração dos preços é necessário que o aumento do gasto público, ou do endividamento, incida diretamente sobre a capacidade da economia de demandar bens e serviços e que o aumento não incentive o crescimento da oferta, quando os preços tenderiam a variar menos ou não variar. 

Ou seja, para que haja inflação derivada do aumento do endividamento é necessário que a economia já esteja em um ponto de capacidade máxima da oferta de bens e serviços. Economistas, em geral, falam sobre pleno emprego como uma condição fundamental para que o aumento do gasto público implique em inflação, isto porque é preciso algum emprego de mão de obra para a produção dos bens ou a prestação dos serviços. Se há escassez de mão de obra, pela interação entre oferta e demanda, os salários podem subir, fazendo com que os preços sejam reajustados para acompanhar o seu aumento.

As críticas sobre a extensão das medidas tomadas pelo Governo Dilma no primeiro mandato normalmente ficam neste ponto, ou seja, de que ao desonerar e promover um aumento da demanda através do crescimento do gasto público, incentivou-se ou alimentou-se o processo inflacionário. É uma forma de analisar e entender a inflação recente, embora não seja a única. Há trabalhos acadêmicos que defendem que o câmbio é o que mais afeta a inflação brasileira nos últimos anos, por exemplo.

Outras ferramentas do BC:

A taxa SELIC não é, no entanto, a única ferramenta do Banco Central no controle inflacionário e da economia. 

Os bancos comerciais e públicos têm por lei um valor mínimo que deixam depositado junto ao BC, além das reservas que mantêm consigo. Juntas, essas limitam a quantidade recursos que podem ser emprestados.

Bancos, de forma simples, emprestam o dinheiro que recolhem junto a quem poupa, cobrando taxas maiores para empréstimos do que as que remuneram o dinheiro recolhido com os poupadores. Desta forma, eles não criam valor, mas geram spread, que é a diferença dos juros que remuneram a quem empresta e os juros que cobra de quem pega recursos emprestados junto a eles. E desse embate - e de outras operações - geram sua receita.

O Compulsório:

Além disso, os bancos, além de manterem certa quantidade de dinheiro em suas contas, mantêm ainda uma reserva obrigatória de dinheiro no BC. Este valor é conhecido como Depósito Compulsório. Como os bancos dependem de recursos depositados para sua atividade - e tecnicamente têm limites para o total de empréstimos que podem fazer - um aumento no Compulsório, diminui a quantidade total de dinheiro disponível para operações, o que diminui o volume de empréstimos, reduzindo o ritmo de expansão da atividade econômica, já que o crescimento e abertura de novos negócios, bem como o financiamento dos já existentes, fica mais restrito.

O redesconto:

Por último, o BC detém uma outra ferramenta conhecida como redesconto. A ideia é simples. Em uma economia de mercado, o Banco Central funciona como um emprestador de última instância, isto é, quando os bancos comerciais e públicos precisam de dinheiro, podem recorrer a ele para obter esses recursos. Na prática, o dia a dia dos bancos é emprestar dinheiro a um valor mais alto do que aquele que usa para remunerar o que pega emprestado de correntistas e do mercado. 

No fim de cada dia os balanços dessa movimentação, ou seja a diferença entre o que foi emprestado e o que está de fato com o banco, têm de atender objetivos da instituição e legais. Quando isto não acontece, a opção é pedir dinheiro ao Banco Central ou a outro bancos. O BC empresta os valores a fim de que o balanço do banco feche corretamente, evitando problemas em série de compromissos que a instituição devedora tem com outras instituições. 

Como controla os valores pelo qual pode ser feita essa operação, o Banco Central pode incentivar mais liquidez ou menos na economia, bastando para isso alterar os valores de redesconto. 

Todas essas três ferramentas - SELIC, Compulsório e Redesconto - são usadas de acordo com os objetivos do BC e com sua visão da condução da política monetária: metas de inflação e outras medidas afetadas como o valor do câmbio. Todas têm impactos sobre a atividade econômica e nas decisões realizadas por todos os agentes econômicos. E reverberam através do sistema financeiro de forma continua - dos empréstimos consignados, ao financiamento de um imóvel, ou ao valor dos juros do cheque especial.

Não são ideias simples e embora o BC possa simplesmente arbitrar os valores para suas ferramentas da forma que entende ser melhor, ele está atento ao mercado e às necessidades de liquidez e da atividade econômica. O FED - BC dos EUA - tem objetivo declarado de manter a inflação em patamares estabelecidos e defender o emprego. O BC brasileiro é comprometido claramente com metas inflacionárias. Cabe a ele conduzir a política monetária de forma a respeitar os limites da atividade econômica e da dinâmica de preços pretendida. Não é obviamente um trabalho fácil, como mostram os 20 anos subsequentes à adoção do real.