Friday 6 June 2014

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Todo mundo guarda seus segredos. Os da dona de casa podem enrubescer maridos, os dos filhos merecerem palmadas, os da mídia, a confirmação de tudo que sempre soubemos - golpista, vendida, entreguista, comunista, interesseira, de direita, marxista, petista. Os dos amantes, as alcovas os guardam. Os dos chefes, às vezes, rendem uma imediata queda na produção de seus subordinados, ou muitas palavras abafadas na máquina de café - "dizem que ele está comendo a secretária dele e a mulher do colega". Tudo em sussurros. 

Aquilo que vai escondido nos paletós dos políticos, normalmente acreditamos, poderia fazer emergir o espírito revolucionário que nunca faltou, mas que teimamos em fingir que nunca houve por aqui - e as forças constituídas de manutenção da ordem teimaram em dizimar. Mas em defesa dos nossos representantes, resiste a teoria de que uma vez tudo preto no branco em relação a suas intenções, seus adversários - os inimigos, as forças terríveis - conseguiriam manipular através da mídia golpista o real sentido de suas palavras: não era uma entrevista, era cilada, diria o pagode. Assim sendo, é necessário marcar com pontos as vogais nas palavras já escritas nos jornais e ditas pelas autoridades e candidatos a autoridade - é assim no hebraico, na política e no economês - para o que você lê todo dia comece a não ser uma língua estranhíssima de região exótica que a gente visita, mas só meia dúzia de seres humanos compreende.

Embora não seja um segredo propriamente dito, a inflação, que hoje toureia o Governo e o Bacen, acende a oposição, enlouquece a classe média, rouba renda dos mais pobres e favorece em quem apostou previamente no estouro da meta, deveria ser melhor explicada. Não será, aliás. Economistas à direita e à esquerda acusarão causas diferentes, e usarão um monte de números, equações, teorias para explicar o óbvio: há um crescente aumento dos preços ano a ano que tem consequências das mais variadas e que é capaz de promover arranjos distributivos imprevisíveis e indesejados. 

O mais importante para colocar pingos nos is nesta história toda é compreender que a inflação é uma, mas pode ter dois diagnósticos reconhecidos por muitas teorias econômicas - acredite, elas são muitas. Ou seja, há apenas dois motivos para a formação da inflação. Porém, há somente um remédio conhecido, testado e em uso no mundo contra os mal do século passado: desaquecimento da economia e o aumento do desemprego. Para isto, ou bem o governo gasta menos - ou aumenta impostos - ou usa a taxa de juros. 

Embora a saída recessiva seja recomendável apenas quando há uma inflação de demanda, ela é usada como antibiótico de amplo espectro. De forma simples, a inflação é o contínuo aumento dos preços de uma economia medido no tempo. Preços aqui são todos os valores em dinheiro pedidos em transações. Uma inflação de custos seria então um aumento agregado de todos os preços derivado de uma variação na oferta de bens. A crise do Petróleo, nos anos 70, que foi um choque negativo no oferecimento desta matéria prima, levou a um aumentos de todos os custos dos países, seria bom exemplo. A inflação resultante veio de um fator externo ao sistema, e ela foi criada a partir da elevação do custo de um bem que impactava economias fortemente.

Já uma inflação de demanda é registrada quando a capacidade de uma economia atender às necessidades de bens e serviços de forma agregada, em seu conjunto, está em seu ponto máximo. É intuitivo. Se você está na praia e está um dia de sol absurdo, muito quente, muita gente e só um grupo pequeno de vendedores, uma cerveja, um coco, uma água, se não houver tabelamento, tendem a ter preços mais altos. Imagine ainda que é uma praia distante, deserta, ir a outro lugar comprar um coco seria difícil, talvez impossível. O que você vê aqui é um caso de inflação de demanda super simplificado. Como sabemos, um país, não demanda apenas bebidas em um dia quente, mas bens dos mais variados e serviços de todos os tipos: cortes de cabelo, financeiros, entrega de pizza em dia chuvoso, etc...

No diagnóstico da inflação de demanda mora um componente importante: uma economia tem uma capacidade máxima de produção no curto prazo. Desta forma, o único jeito de aumentar a oferta agregada de bens e serviços - a fim de aproveitar a demanda aquecida - seria um aumento da capacidade produtiva. Todos os modos de expansão da oferta agregada implicam custos. Ou contratam-se mais pessoas, ou compram-se mais máquinas, ou mais matérias primas, ou trabalha-se mais. Estes custos são financiados com empréstimos ou com capital disponível das empresas e do Governo. Desta forma o aumento da taxa de juros, deve diminuir o investimento, porque se torna mais cara a ampliação da atividade produtiva via financiamento.

Veja: se o custo dos empréstimos para expansão sobe, fica mais caro para quem produz aumentar sua escala de produção. E o custo do dinheiro é dado pela taxa de juros, aquela que o Banco Central controla - recentemente aumentada. De forma simples, o Banco Central empresta dinheiro para bancos e fixa um patamar mínimo de juros cobrados nos empréstimos. Se o preço do dinheiro sobe, menos pessoas ampliam seus negócios, logo a oferta de bens e serviços não cresce significativamente, o que provoca um viés de preços que não baixam. Por outro lado, sabe-se que excetuando o consumo de primeira necessidade, quando os preços aumentam, as pessoas demandam menos bens e serviços. Se comer fora fica mais caro, para a maior parte das pessoas, isto significará comer mais em casa. 

Desta forma, preços mais altos desestimulam o consumo de bens não essenciais. Aos poucos, a diminuição da demanda força uma diminuição dos preços. Mas é necessário mais que isso para que uma vez que os preços baixem as pessoas simplesmente não demandem mais jantares fora de casa aumentando os preços de novo.

A conjunção da diminuição dos investimentos com a do consumo cria um freio do crescimento econômico. Alguns preços são mais ou menos reativos ao aumento da taxa de juros. Mas devem ceder de maneira mais ou menos geral, ou ao menos, parar de acelerar, com a queda no consumo. Mas falta ainda entender uma outra coisa e, desta, os políticos, economistas, em geral, não falam.

Trata-se do efeito da taxa de juros no mercado de trabalho. Tudo mais mantido constante, dia a dia, mais pessoas devem entrar na fase adulta da vida - seja lá o que isso signifique - e procurar trabalho - seja lá o que isso signifique. Tudo mais mantido constante novamente, o número de demandantes por empregos cresce. Se essas pessoas acharem ocupações, a economia cresce pois há mais pessoas com renda e esta renda poderá ser usada em transações ao longo da sociedade que permitem novos encadeamentos. Exemplo: você encontra emprego e passa a comer fora uma vez por semana, ou almoçar todos os dias em restaurante. Com isso, o dono do restaurante ganha mais um cliente, talvez empregue mais um garçom ou cozinheiro, talvez abra um segundo restaurante e assim o movimento de mais um salário provoca multiplicações de renda ao longo da economia.

Se muitos não encontram emprego, no entanto, a economia não cresce. O tal do PIB não cresce com mais gente desempregada, tudo mais mantido constante. Se a taxa de juros sobe, sabemos, diminuem parte dos investimentos em atividades produtivas - fica mais caro abrir o segundo restaurante, contratar o novo cozinheiro, comprar um estoque maior de massas ou comprar um novo fogão. A taxa de juros subindo, mais ou menos como na célebre cena de Casablanca, um dia, pode não ser hoje, pode não ser amanhã, mas, um dia, o desemprego subirá. 

Na teoria econômica mainstream - a que hoje é a de Aécio, Mantega, Tombini, Eduardo Campos, Leda Nagle, da Mirian Leitão, do presidente do Fed, do pipoqueiro da esquina e de seu chefe - desemprego é um fator importante para controlar a inflação. Se o entendimento que temos é o de que um aumento da oferta permite que os preços abaixem - surgem novos vendedores de coco na praia, eba! - o desemprego arrefece o ânimo altista, pelo lado da demanda, dos preços. Isto porque, considera-se que a oferta agregada pode crescer no longo prazo por fatores externos: nível tecnológico e qualificação. Mas a demanda obedece às variáveis de dentro do sistema: consumo, investimento, gastos, exportações, importações. 

A explicação do uso do remédio dos juros mora na teoria criada há uns 200 anos para o comportamento do mercado de trabalho. 

No mercado há pessoas que querem trabalho e pessoas que precisam de trabalhadores. Se o número de patrões aumenta, ou se são necessários mais empregados, existe uma tendência à alta dos salários. Se o contrário acontece, uma baixa deve ser enxergada no preço da mão de obra. O desemprego é um desestímulo a reivindicações salarias, obviamente. O trabalho, nesta visão, um encorajador. Veja ainda que, aqui, o trabalho é como o coco na praia, tanto faz de quem você compre, importa é que tenha água, como diria Ford. 

De novo, é uma simplificação, mas que serve em muitos setores. Assim sendo, se sabemos que o custo da mão de obra é parte da formação de muitos preços - em uns mais, em outros menos - a capacidade de trabalhadores demandarem maiores salários reforça o curso de alta dos custos que deve levar a preços mais altos. Há apenas um agravante aqui. Trabalhadores negociam seus salários com vistas ao movimento não apenas do desemprego, mas dos preços. Em um cenário em que os preços aumentam - tudo mais mantido constante - trabalhadores demandarão maiores salários. Aí, a pressão por maiores salários contamina direta ou indiretamente a pressão por maiores preços. Desta forma, independente de quem consegue repassar maiores aumentos, cria-se uma tendência inflacionária.

Por isso, é através do desemprego e da diminuição da atividade econômica que a elevação dos juros combate a inflação. No fundo, o que se pretende é diminuir os repasses de aumentos de preços e fixar salários através da ancoragem das expectativas e da diminuição do poder de barganha dos trabalhadores. Ou seja, juros mais altos proporcionam, neste modelo, controle da inflação porque reduzem a atividade econômica através da diminuição do investimento e da redução do consumo causada pela diminuição do emprego. Obviamente, a recessão não elevará o PIB, mas controlará ao menos temporariamente a tendência à alta de preços. Sobre os custos - desemprego, crescimento provável do endividamento do Governo, das famílias e do setor produtivo, redução da renda gerada, aumento dos gastos com seguros e previdência - menos gente trabalhando é menos gente contribuindo - obviamente, disto, nossos candidatos não falarão. 

O detalhe é que este "ajuste" só funciona com o diagnóstico de uma inflação de demanda, que é a variedade da doença em que o Governo e a oposição balizam suas propostas para o próximo mandato na cadeira mais alta da república. Se assim é, ao menos, poderiam ser mais sinceros com seus eleitores. Segredos têm motivos - às vezes são pessoais, às vezes não. Mas o interesse público no debate e na tomada de rumos deveria ser preponderante. Não é. Todos falam em ajustes. Ninguém fala em custos.

*Tem coisas que não se conta nem para avó.

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